quinta-feira, 23 de março de 2017

Breves Lembranças dos Cinemas em Simão Dias. (Sergipe)




Publicado originalmente no Facebook/Carlos Alberto Déda, em 22/03/2017.

Breves Lembranças dos Cinemas em Simão Dias.
Por Carlos Alberto Déda*

Dia desses fui indagado pelo professor e pesquisador conterrâneo Jorge Bastos sobre o cinema de nossa terra. Gostei da indagação porque sempre fui fã da conhecida sétima arte. Frequentei com assiduidade o Cine Ypiranga e o Cine Brasil em minha terra natal e, também, os das cidades em que morei: em Aracaju (os cinemas Rex, Rio Branco, Vitória e Palace), em Salvador (o Guarani, o Excelsior e o Capri) e em Jequié (o Cine Auditório e o Cine Jequié).

Ultimamente assisto aos filmes na televisão ou no computador. E o bom filme, o que acho supimpa, eu costumo ver repetidas vezes, como é o caso dos dirigidos pelos geniais Fellini e John Ford. E quando faço isto, minha paciente Leninha indaga: - Quer decorar?

Tenho boas recordações dos cinemas de minha terra e algumas delas eu relembro aqui para os amigos.

Contava meu saudoso pai que quando o cinema teve início em nossa cidade, as fitas eram projetadas manualmente, em locais improvisados, e que as pessoas interessadas, além de pagar o ingresso, tinham que levar suas próprias cadeiras para assistirem às fitas confortavelmente sentadas.

Naquele tempo predominavam as apresentações teatrais. Em 1918, foi inaugurado o Theatro Sylvio Romero, na Rua do Espinheiro, construído pelo o Cel. Felisberto Prata. Em 1921, aquela casa de espetáculos foi adaptada à projeção de filmes e passou a ser chamada de “Cine-Theatro Sylvio Romero”. Em 1923, sob a liderança de Arivaldo Prata (filho do Cel. Felisberto), surgiu o jornalzinho Cine-Jornal, que trazia logo abaixo do seu título a importante informação: “Folha de interesses locais e destinada a propaganda cinematográfica, editada pelo Cine-Theatro Sylvio Romero”.

Na década de 30, a aparelhagem do cinema foi vendida e surgiu na cidade o Cine Elite, que durou poucos anos.

O jornal “A Luta”, de Emílio Rocha, publicou várias notícias sobre o cinema em nossa terra.
Em 1943 o Sr. Pierre Freitas adquiriu nova aparelhagem e o prédio do Cine Theatro Sylvio Romero, então mudou o nome para Cine Teatro Ypiranga.

Dez anos depois, em 1953, foi inaugurado um novo cinema na cidade, construído pelo Sr. Durval Conceição, com o nome de Cine Brasil.

Posteriormente o Cine Brasil foi vendido ao Sr. Antônio Resende; e o Cine Ypiranga vendido ao Sr. Edinho de Lagarto. Com o passar dos anos e diante da concorrência da televisão, os cinemas fecharam.

Hoje temos apenas boas recordações daquelas casas de espetáculos. Aqui mesmo, já fiz relatos de minha presença no Cine Ypiranga, vendendo gibis, editados pela “Rio Gráfica Editora”, que meu irmão Carlos representava em Simão Dias.

Ao falar sobre os cinemas de nossa terra, o principal fato que me vem à mente é o desabamento da “geral” do Cine Ypiranga. Em nossa terra, denominava-se “GERAL” a parte superior do cinema, com bancos desconfortáveis, e que se cobrava um valor menor pelo ingresso; era o local preferido pelos que tinham o hábito de soltar gases mal cheirosos e sonoros, ou seja, peidos fedorentos e estrondosos.

Em uma noite de sábado, dia de feira na cidade, em 1961, o cinema estava lotado. Era exibido o filme brasileiro “A morte comanda o cangaço”. A fita mostrava uma luta sangrenta patrocinada pelos cangaceiros. Tiros, fumaça das armas, barulheira da artilharia dos jagunços e a plateia atenta, vibrando de emoção. Envolvidos no alvoroço da filmagem, os espectadores não notaram, de imediato, o estranho ruído e a fina poeira que desprendia da “Geral”.

Pois bem. Assim que perceberam que o som e a poeira não correspondiam aos efeitos especiais do filme, mas era o sinal de que a “geral” estava desabando, aí a plateia iniciou uma louca debandada no escuro, procurando saídas pelos fundos, por traz da tela, em direção à Rua dos Pinicos (era assim mesmo que era conhecida a rua que passava por trás do cinema).

Os que estavam nas filas próximas à entrada, seguiram a liderança de Dr. Fraga e Seu Manequinha, que eram pessoas bem conhecidas e admiradas na cidade. Eram corpulentos, então, diante do pânico, meteram as barrigas na grande porta da frente, quebrando os ferrolhos, escancarando-as em bandas, para dar passagem aos aflitos seguidores. O tumulto foi grande, mas, felizmente, não houve vítimas. Muitos perderam sapatos, chinelas e até chapéu, no entanto, nunca perderam o bom humor ao comentar a cena, sempre caprichando em satirizar o que se passou com cada um, sem esquecerem, ao final, mencionar a frase que se tornou frequente naqueles dias: “A morte comandou o cangaço, mas não comandou o Cine Ypiranga”.

Lembro-me, agora, de outro fato que aconteceu no Cine Brasil e me foi contado por uma pessoa que admiro muito e que se viu em uma verdadeira “saia justa”. Certa noite o amigo foi ao cinema com sua mulher. Antes de iniciar o filme, foi projetado um documentário sobre uma tribo de índios no Xingu. A fita exibia indígenas nus, com as intimidades expostas. O recatado casal não gostou do que via e tentou sair discretamente. Quando se aproximavam da saída, foram abordados por seu Antônio, proprietário do cinema, que exclamou em voz alta, mencionando o apelido do amigo, para que todos ouvissem:

- “Meu amigo (...) se eu soubesse que nesta fita apareciam índios nus eu não permitiria a projeção...”.

Surpreendidos pela quebra de privacidade da cautelosa saída, o envergonhado casal esgueirou-se porta a fora, ouvindo as gargalhadas e os gritos dos espectadores em consequência da espalhafatosa declaração do dono do cinema.

*Aracaju, 22/03/2017 - Beto Déda.

Texto e imagens reproduzidos do Facebook/Carlos Alberto Déda.

Nenhum comentário:

Postar um comentário