Cinema Paradiso.
Por Tatiana Hora.
Alguns alunos que estudavam no Colégio Tobias Barreto
matavam aula para ir ao Cinema Palace no centro da cidade de Aracaju. O
jornalista e crítico de cinema Ivan Valença era um deles, e conta que os
estudantes trocavam de blusa, as meninas viravam as saias pelo avesso, tudo
para esconder o símbolo do colégio, pois não era permitida a entrada de alunos
fardados segundo determinação do juizado. “Lá dentro era uma algazarra, as pessoas
gritavam, mas era divertido”, conta o jornalista. Cerca de 40 anos depois dessa
época, em 1997, chegaram as salas multiplex ao Brasil, que se localizam em
cidades com mais de 400 mil habitantes e ficam em shoppings centers. Em
Sergipe, um exemplo desse tipo de sala são as do Cinemark e do Moviecom.
O Cinemark é uma das três maiores redes de exibição de
cinema no mundo, e chegou à Aracaju em 1998, funcionando no Shopping Jardins
com nove salas que passam filmes simultaneamente. Menos de um ano depois, as
duas salas de cinema que existiam no Shopping Riomar fecham. Quatro anos mais
tarde o Moviecom inaugura cinco salas no Riomar. “O domínio das multiplex está
ligado ao novo padrão de produção, distribuição e exibição no capitalismo
global”, afirma o mestre em Cinema pela Universidade de São Paulo (USP), Caio
Amado. Os estúdios de Hollywood vendem seus filmes para as grandes
distribuidoras, que, por sua vez, negociam dias e horários com as empresas
exibidoras, proprietárias das salas multiplex. Esse é o caminho percorrido por
um filme americano até ser exibido no Cinemark, do Shopping Jardins.
Antes das salas multiplex chegarem à Aracaju, havia vários
cinemas no centro da cidade, como o Palace, que hoje é uma casa de bingos. O
Cinema Palace tinha sessões especiais e era muito freqüentado pela elite
sergipana. Havia também várias salas que pertenciam à Igreja Católica, como o
Cine Vitória e o Cinema Vera Cruz. “A Igreja estava muito preocupada com o que
os fiéis viam. Eles recomendavam quais filmes poderiam ser vistos”, explica
Ivan Valença.
A primeira sala de cinema de Sergipe foi o Cine Rio Branco,
inaugurado em 1912, um dos primeiros cinemas do país, e que antes era o Teatro
São José. “Havia cinemas de bairro como o Cinema Guarani, perto da casa onde eu
morava, na Praça da Bandeira. Eu vi filmes extraordinários ali”, lembra Caio
Amado.
Nas cidades do interior do estado existiam várias salas de
cinema, como Itabaiana, que tinha 3 salas. Segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 92% dos municípios no Brasil não
têm nenhuma sala de projeção. A professora Adenildes Carvalho mora num sítio em
Boquim e conta da primeira vez em que foi ao cinema, em Aracaju. “Foi incrível.
Era uma tela enorme. Eu achava que as cadeiras estavam girando. Pensava: será
que vou entrar no filme?”, relata. “Eu não vejo a hora de ir a Aracaju para ir
ao cinema”. Para Cristiano Leal, professor da área de Comunicação Social e
cinéfilo, o cinema é um ritual. “O cinema é uma experiência coletiva. As
pessoas riem junto com o filme, e às vezes aplaudem”, diz.
O fim - Durante a década de 1980, o Cinema Rio Branco passou
a exibir filmes pornôs. Segundo o antropólogo José Marcelo Domingos, o que
atrai o público desses espaços é a possibilidade de encontrar um parceiro
sexual sem prejudicar a imagem construída em sociedade. “No escuro do cinema
você se torna anônimo. Há um clima de penumbra em que você não vê o outro e o
outro não lhe vê por completo”, diz.
O que antes era o Cine Rio Branco, agora é uma loja de tecidos,
a tela do Cine Plaza deu lugar a um altar, e um estacionamento ocupa o espaço
onde antigamente os espectadores assistiam a filmes no Cinema Aracaju.
Texto e imagem reproduzidos do site: overmundo.com.br
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