quarta-feira, 24 de abril de 2019

A verdadeira história da mulher mais famosa do cinema...

A famosa "dama da tocha", a conhecida figura que
abre todos os filmes da Columbia Pictures desde 1922

Publicado originalmente no site do jornal El País Brasil, em 24/04/2019 

A verdadeira história da mulher mais famosa do cinema (e você nem sabe o nome dela)

A 'dama da tocha' aparece em centenas de filmes: é a imagem da Columbia Pictures. Sabemos a identidade da última delas, mas sobre os anteriores só há rivalidade e lendas

Por Guillermo Alonso 

Esta mulher aparece apenas 18 segundos em cada filme, mas faz isso em muitos. No ano passado, estreou em 13. Há uma boa probabilidade de que essa seja a pessoa que você mais viu na história do cinema. Mas quase ninguém sabe como se chama. Talvez, apenas a 'dama da tocha'. Abre todos os filmes da Columbia Pictures desde 1922, contados em centenas. E embora o logotipo tenha mudado várias vezes em seus quase 100 anos de história, a figura da 'dama da tocha' permanece inalterada.

(Com exceção, é claro, daquela ocasião em que, no início do delírio disco-kistch Até que Enfim é Sexta-Feira!, a maior glória de Motown, a 'dama da tocha' começava a dançar).

Amelia disse que quando a identidade da 'dama da tocha' começou a causar intrigas, telefonou para a Columbia e disse que era ela. A moça que a atendeu não acreditou nela: dezenas de mulheres tinham ligado dizendo a mesma coisa

O logotipo da Columbia Pictures é reconhecido pelos espectadores em todo o mundo. Está (quase) no nível do leão que ruge da Metro Goldwyn Mayer e anda de mãos dadas com o castelo da Disney ou a montanha da Paramount (que, segundo a lenda, é o pico Artesonraju, do Peru). O que é menos conhecida é a história por trás da mulher da tocha e, em alguns casos, até mesmo sua identidade.

Só se sabe com certeza qual é a mulher que apareceu no logotipo da empresa nos últimos 27 anos. Em 1992, a Columbia Pictures pediu ao pintor Michael Deas, conhecido por seus retratos de presidentes e estrelas do cinema clássico, que reformulasse a popular imagem. Para isso, Deas pediu a ajuda da fotógrafa Kathy Anderson para lhe dar imagens de referência. Em julho de 1991, Kathy pediu a uma de suas colegas de trabalho em um jornal de Nova Orleans, a designer gráfica Jenny Joseph, que posasse em seu pequeno apartamento diante de um pano preto, usando uma túnica e segurando uma tocha.

Jenny não imaginava que aquela imagem seria a mais vista nos cinemas de todo o mundo. Dizem que foi escolhida porque tanto Michael como Kathy achavam que se parecia com a mulher da tocha que aparece nas versões anteriores do logo da famosa produtora. Jenny não era modelo, como contou a própria Anderson: não tinha posado antes para uma câmera, nem voltou a fazer isso depois.

Mais tarde, Jenny se mudou de Nova Orleans para o Texas, casou e teve filhos. Crianças que cresceram tranquilamente com a ideia de que sua mãe aparecia sempre nos cinemas antes do início de alguns dos filmes de maior bilheteria de cada ano. Uma curiosidade: algumas pessoas acharam que a mulher era a atriz Annette Bening, por encontrarem uma certa semelhança com ela. Foi um rumor que circulou em Hollywood por alguns anos. Em alguns sites, Bening aparece como uma das 'damas da tocha'. Não é.

Mas quem apareceu antes nessa mesma posição? É muito complicado determinar o nome das mulheres que seguraram antes a tocha, embora o cinema seja uma indústria na qual tudo é gravado e registrado para a memória. Mas, de acordo com a Columbia Pictures, não há documentação para comprovar se algumas das mulheres que afirmam ter sido a 'dama da tocha' estão dizendo a verdade.

Evelyn Venable, que afirmava ter sido a modelo do 
logo da Columbia Pictures em 1939, em uma 
imagem publicitária tirada em Londres em 1935

Uma delas poderia ser Claudia Dell. Aparece em uma autobiografia de Bette Davis (The Lonely Life, 1962), em que a atriz vencedora do Oscar se refere a uma "jovem Claudia Dell, cuja imagem foi usada como logotipo da Columbia Pictures durante anos". Dell (1910-1977) foi uma atriz de cinema e televisão que nunca chegou muito a Hollywood e estagnou em filmes B, mas se casou com homens poderosos na Califórnia e levou uma vida abastada.

Outra era Evelyn Venable (1913-1993), atriz mais conhecida por seu papel em Uma Sombra que Passa (1934), que na década de noventa teve uma versão bastante livre com o título Encontro Marcado, estrelada por Brad Pitt. Ela afirmou ter sido modelo para o logotipo da Columbia em 1939. O site do IMDB, uma das páginas de referência para os cinéfilos, considera o dado confiável.

Depois vem Amelia Batchler (1908-2002), que em uma reportagem da revista norte-americana People é apresentada como a mulher que posou para o logotipo da tocha durante anos desde 1936. "Um dia, Harry Cohn [que foi o primeiro presidente da companhia] me disse: 'Vá para o vestiário, eles vão te vestir. Há um artista italiano que quer te pintar. Isso foi em 1935 ou 1936. Eu era uma artista contratada e por 75 dólares por semana fazíamos de tudo, exceto esfregar o chão”.

Jenny Joseph mudou-se para o Texas, casou e teve filhos. Crianças que cresceram com a ideia de que sua mãe aparece no início dos filmes de maior bilheteria de cada ano

Amelia, segundo seu relato, nunca perguntou para que seria aquela pintura. Descobriu alguns anos depois que sua imagem aparecia no começo de todos os filmes da Columbia. "Direitos de imagem? Você está brincando? Não pagavam nada disso a ninguém naquela época. Isso foi muito antes de haver sindicatos.” Como anedota, o seguinte: Amelia disse que muito mais tarde, quando a identidade da 'dama da tocha' começou a intrigar a imprensa e os espectadores, telefonou para a Columbia para dizer que era ela, no caso de que quisessem escrever algum tipo de história ou comunicado sobre isso. Mas a moça que a atendeu não acreditou nela por uma razão muito simples: dezenas de mulheres tinham telefonado antes dizendo a mesma coisa.

Jane Bartholomew, que disse ser uma das modelos 
que inspirou o logotipo da Columbia Pictures, 
posa no quarto de sua casa, em 2001

Uma dessas outras garotas poderia ser Jane Bartholomew. O prestigioso jornal norte-americano Chicago Sun Times considerou boa a sua história e publicou uma reportagem sobre ela. Segundo Bartolhomew, seu rosto é o que aparece nos anos quarenta (o que confrontaria sua história com a de Batchler) e foi recrutada, como no caso anterior, pelo chefe Harry Crohn. Isso aconteceu em 1941, de acordo com sua história, e ela recebeu 25 dólares. O jornal acompanhou a reportagem com uma imagem realmente bonita: a já idosa Jane posa em seu quarto de uma casa de repouso, enquanto atrás dela, penduradas na parede, aparecem várias fotografias da que provavelmente era ela (ou não) em sua personificação da 'dama da tocha'.

O curioso desta história é que todos os relatos poderiam ser verdadeiros: o logo da Columbia Pictures é uma pintura e os diferentes artistas aos quais o estúdio a encomendava pedem fotografias como referência. Não há dúvidas quanto à última encarnação da identidade porque todos os envolvidos estão vivos e há até vídeos da sessão. Seria possível que nos anos trinta ou quarenta o artista se inspirasse em diferentes fotografias para desenhar a sua "torch lady", como é conhecida em inglês a figura que abre todos os filmes da produtora. Essa figura que, sem nome, sem dados e sem história, é a mulher que vimos mais vezes quando a luz do cinema se apaga. Mas, antes de Jenny Joseph, será difícil conhecer a identidade das outras: todas estão mortas.


Trecho de uma reportagem (em inglês), publicada em 2013, em que se pode ver imagens de Michael Deas e Jenny Joseph, pintor e modelo da 'dama da tocha' da Columbia Pictures

Texto, imagens e vídeo reproduzidos dos sites: brasil.elpais.com e youtube.com

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