“Fiz o contrário do que se esperava”
O cineasta Kleber Mendonça Filho narra a ascensão de sua
trajetória, que contribui para o cinema vencer preconceitos estéticos,
fortalecer e descentralizar a produção audiovisual no Brasil
Por Débora Nascimento e Luciana Veras
Foto de Breno Laprovitera
Kleber Mendonça Filho é hoje o cineasta pernambucano de maior repercussão internacional. Dois de seus três longas de ficção, O som ao redor (2012) e Aquarius (2016), foram incluídos na lista dos 10 melhores filmes do ano pelo New York Times. Dois deles, Aquarius (2016) e Bacurau (2019), estrearam mundialmente no Festival de Cannes, concorrendo a mais renomada categoria da premiação, a Palma de Ouro. Saíram sem ela, mas Bacurau levou o importante Prêmio do Júri. A honraria vem se somar às 120 de premiações que o diretor acumula ao longo de mais de 20 anos como realizador, com 11 produções – sete curtas e quatro longas, incluindo o documentário Crítico (2008).
Esse último filme reúne depoimentos de vários críticos e diretores a respeito da importância da crítica de cinema, trabalho que Kleber cumpriu durante 13 anos no Recife, sendo um dos mais influentes do país. Em paralelo à função, também atuou como programador do Cinema da Fundação, prestigiada sala alternativa ao circuito comercial na capital pernambucana, contribuindo para a formação do olhar de, pelo menos, duas gerações de cinéfilos. A propósito, na Fundaj, foi responsável, em 2001, pelo curso de Olhar Crítico, do qual saíram nomes da nova leva de profissionais do audiovisual local, como Daniel Bandeira, Pedro Sotero e Juliano Dornelles, com quem o cineasta codirigiu Bacurau.
Em meio ao lançamento desse seu terceiro filme de ficção, Kleber Mendonça Filho concedeu uma longa entrevista à Continente, na qual resgatou o começo de sua paixão pelo cinema, desde os tempos em que era levado pela mãe, a historiadora Joselice Jucá, às antigas salas de exibição, passando pelo período em que morou na Inglaterra, até ao impacto da volta, quando percebeu que sua terra natal estava “enjaulada”.
Nesta conversa, o cineasta revela a fonte de suas inspirações, fala de seu novo projeto, analisa a mudança de temáticas no cinema brasileiro, critica o atual desmonte na área e comenta sobre a multa que está sendo obrigado a pagar ao Ministério da Cultura, entendida como retaliação e anunciada exatamente dois anos após a rumorosa denúncia do que estava por trás do impeachment de Dilma Rousseff, feita pelo diretor e equipe, no tapete vermelho da première de Aquarius em Cannes, em maio de 2016. “Vários jornalistas vieram me falar isso: ‘A gente não tinha noção do que estava acontecendo, agora a gente tem’. Tenho um orgulho enorme do protesto que a gente fez”.
CONTINENTE Como era a sua relação com imagem na infância? Quais são as primeiras lembranças de cinema e TV?
KLEBER MENDONÇA FILHO Desde muito cedo, eu tinha uma
inclinação muito forte para o cinema, para a ideia de cinema. Não é uma coisa
que eu descobri aos 11, 14 anos.
CONTINENTE Qual a lembrança mais remota de um filme?
KMF São duas: uma ida ao São Luiz com minha mãe para ver uma
maratona Tom & Jerry, que tinha muito naquela época. Você via mais de uma
hora de desenho animado. E a outra é de um filme chamado A ilha no topo do
mundo, que passou no Boa Vista. E eu era tão criança que, quando a gente saiu e
estava na frente do cinema, vi o cartaz e reagi com muito espanto: “Olha o
cartaz do filme que a gente viu!” Isso foi em 1973, eu tinha cinco anos. Éramos
eu e meu irmão. Naturalmente minha mãe levava os dois ao cinema. Uma coisa em
que eu penso muito é que a minha geração é a última que teve acesso às grandes
salas funcionando normalmente. O normal era você ir ao São Luiz, ao Moderno,
Art Palácio. Eu tive isso ainda como jovem adulto. Mas aí eles acabaram. Cada
cinema tinha uma personalidade forte, não só arquitetonicamente, mas a
programação de cada um tinha uma personalidade forte. O Moderno era o cinema
pancadão, os filmes mais hards, de cabra macho. O Veneza eram as grandes
produções, os blockbusters. O São Luiz era muito popular. Pernambuco teve muita
sorte de ter essas salas, construindo uma ideia de cinema em cada um.
CONTINENTE Essa era a sua maior diversão na infância?
KMF Era uma infância normal, de ter os amigos na escola, de
ir pra casas de amigos, jogar bola…, mas ir ao cinema era extremamente
importante para mim. Lembro-me de digitar numa máquina de escrever pedidos pra
minha mãe me levar pra ver tal filme da programação. Ela sempre estimulou
muito.
CONTINENTE Nessa época, qual era o gênero de que você mais gostava?
KMF Mas isso é outra coisa. Era uma época muito… Agora, você
tem grandes filmes, mas, naquela época, você tinha grandes filmes populares.
Hoje, é mais difícil você ver um grande filme popular. Mas, naquela época, você
via grandes filmes, terça à tarde, no Art Palácio. Acho que tive muita sorte de
crescer nessa época. Atualmente, os filmes que eu via passam em cinemateca e
festivais de cinema em cópias restauradas para os jovens redescobrirem. E você
ia numa terça à tarde ao Art Palácio. Ou Moderno, ou Veneza.
CONTINENTE Você tinha uma sala preferida?
KMF Estou fazendo um próximo filme que é um ensaio sobre
arqueologia, a partir do centro do Recife. A partir das salas extintas. Venho
trabalhando nisso há alguns anos. Filmei em VHS, um pouco super-8 e um pouco de
U-Matic, da Center. A propósito, o Genivaldo (di Pace), da (produtora) Center,
merece alguma coisa muito importante sobre ele. Ele está em toda produção
pernambucana dos anos 1990, de Fernando Spencer a Paulo Caldas, Lírio Ferreira,
Cláudio Assis. Ele ajudou todo mundo. Enjaulado foi todo feito com a Center.
Única sala que sobreviveu, o São Luiz é a nossa unanimidade, o cinema que nós
amamos. Mas, se for realmente conversar com as pessoas, o cinema que está
instalado no coração delas é o Veneza. Uma vez, postei no Instagram uma foto do
Veneza, como ele era e na visita a que eu fui recentemente. Foram 300
comentários. Não são comentários bobos, mas de coração. Isso me fascina, porque
é o impacto que uma construção tem. Alguém fez aquilo com tijolo, com cimento e
com decoração, e teve um impacto nas pessoas. Imagina se fecha o Multiplex
Tacaruna, eu não sei se alguém vai dizer “Aquela sala 4 era tão linda…”. Porque
é tudo padrão de caixa de sapato, que tem que ser prático.
KMF Por ser centro da cidade. Na última sexta-feira,
aconteceu uma coisa linda. A gente saiu da casa de uns amigos, veio pela Rua do
Hospício de carro e passou na frente do Veneza, e pensei: “Quarenta e cinco anos
atrás, teria uma fila aqui para a sessão das 10. Ah, que pena!”. Mas, chega na
esquina da Conde da Boa Vista, tem um grupo maravilhoso de 60 jovens, de todo
tipo. Aí fiquei assim: “Que negócio massa!”. Ou seja, a cidade muda, mas
continua viva. Agora o Veneza está numa metamorfose quase orgânica, biológica,
transformando-se num shopping de baixa renda. Eles estão construindo quase como
se fosse uma obra de Escher. A parte de cima, onde era o balcão, está
totalmente intacta porque não sabem o que fazer. A parte de baixo, onde era a
plateia, virou um monte de cubos, corredores, boxes. Isso fala muito de como a
cidade vai virando outra coisa. Você vai a um lugar, passa o dedo em uma
parede, e já vê o passado daquele lugar embaixo da tinta.
CONTINENTE Vamos retomar essa lembrança da sua infância e adolescência. Teve um período em que você foi para a Inglaterra, não é? Como foi?
KMF Minha mãe foi fazer o doutorado em História na
Inglaterra e levou os filhos. E a gente ficou de 1982 até o final de 1986. Foi
um período muito bom. De adolescência, de 14 a 18 anos. A gente morou em
Colchester, em Essex, cidade do Blur. Meus pais já tinham se separado. Meu pai
ficou no Brasil. Ficamos quatro anos sem vir ao Brasil, porque a viagem de
avião era uma coisa mais difícil do que é hoje.
CONTINENTE Qual a importância desse período para a sua formação cultural?
KMF Acho que é gigantesca. Mas, ao mesmo tempo, essa
pergunta cai um pouco feito aquela pergunta do “Você acha que ter sido crítico
lhe ajudou?” Não sei, mas talvez sim. Não dá pra quantificar. Morar na
Inglaterra me deu uma língua, que eu domino muito bem. Isso é muito importante.
Hoje, muito mais gente fala inglês do que se falava naquela época. Quando eu
voltei, era uma coisa mais inacessível. Por causa da internet, o inglês é mais
presente. Mas ele foi muito importante, pra ler, pra fazer amigos.
CONTINENTE A experiência de ser espectador de cinema na Inglaterra era diferente de ser espectador no Brasil?
KMF Na verdade, no Recife eu tive acesso a tudo a que o
mundo e os ingleses tiveram nos anos 1970. De Palma, Spielberg, Superman, tudo
passou aqui. Eu cresci vendo isso. Tive a sorte de ver o bom momento do cinema
americano popular. Na verdade, aprendi, já ali, que é possível ser popular e
bom. Você não precisa ser popular e ruim. Autoral e inacessível, que eu acho
que é uma distorção que existe no cinema brasileiro. Existe sempre o abismo
entre filme popular e filme autoral, que é exatamente a junção que tento fazer
nos meus filmes. O que aconteceu na Inglaterra é que, de uma maneira natural,
eu saí da dieta americana, porque, se você deixar correr solto, é o que vai
formar todo mundo.
CONTINENTE Era o que a gente tinha com mais assiduidade aqui e mais acesso.
KMF Por sorte, nos anos 1970, vi filmes incríveis que até
hoje são muito bons. São filmes que entraram na história do cinema e eram
americanos. Só que, ao chegar à Inglaterra, por causa do Channel 4, BBC, dos
cineclubes, comecei a ter acesso a uma outra dieta – sem desmerecer a dieta
americana, de que continuo gostando. Mas aí tem os filmes desses caras chamados
Herzog, Fassbinder…
CONTINENTE Você lembra se viu alguma coisa de Truffaut na Inglaterra?
KMF A primeira vez que vi Truffaut foi no Channel 4. E é
interessante porque eu vi sem ter noção da importância dele. Eu simplesmente
amei o filme. Era Os incompreendidos. E, anos depois, no primeiro semestre na UFPE,
começou uma discussão do professor, que falou desse filme e mostrou uma foto.
Eu: “Eu vi esse filme. Esse filme é muito bom!”. Aí comecei a entender a
importância dele. Outro momento importante foi a estreia, na TV inglesa, de
Fitzcarraldo, do Herzog. Ele teve algum dinheiro do Channel 4, estreou na TV
inglesa um mês depois do cinema. Não passou na minha cidadezinha, passou em
Londres. Íamos a Londres todo mês. Era religioso. Minha mãe levava pra cinema,
exposição, concerto e sempre acabava com filme no Leicester Square. Às vezes,
íamos no sábado e dormíamos lá. Geralmente, chegava cedo e voltava à noite.
CONTINENTE E, na volta ao Brasil, você teve um choque?
KMF Não tive um choque indo, nem tive um choque voltando. Eu
estava muito interessado pela Inglaterra indo e muito interessado pelo Brasil
voltando. Voltei em 1986, a cidade estava coberta de cartazes de Arraes. Meu
tio foi pegar a gente no aeroporto e o carro dele estava coberto de papel de
Arraes, colado na lataria, com os dizeres: “Vai voltar pela porta que saiu”.
CONTINENTE Você já tinha uma ideia de política na época?
KMF O Brasil, muito bagunçado, dava pra ver na cidade.
Claro, quatro anos, como adolescente na Inglaterra, você volta para o Brasil
com a coisa da inflação, o país recém-saído do Plano Cruzado, a morte de
Tancredo. Mas do que eu senti muita falta era da música. Eu tinha me apaixonado
por música pop. E, quando voltei para o Brasil, não tinha. Eu ia para a banca
da Rua Sete de Setembro comprar a New Music Express, a Rolling Stone de três
meses atrás. O RPM era um fenômeno, aí todo mundo falava que era incrível. Fui
ouvir e achei muito ruim. Nessa época, eu já tinha ouvido The Cure, Eurythmics,
Tears for Fears, Queen, Prince, que eu vi duas vezes antes de voltar. Mas o que
me manteve feliz é que eu voltei e continuava tendo grandes salas de cinema,
vendo filmes fodas, com qualidade excelente. Continuei indo para o Veneza, vi
Veludo azul e A mosca no São Luiz. É como se eu tivesse saído da Inglaterra – e
o cinema fez essa ponte.
CONTINENTE Você não sentiu no cinema a mesma interrupção na música.
KMF Eu senti falta de ver mais filmes fora do esquemão, mas
aí já tinha VHS. Voltamos para o apartamento original, em Setúbal. Isso foi um
pouco um choque, porque foi aí que começou toda essa observação que está nos
filmes. A gente voltou para Setúbal e eu percebi duas coisas. A casa onde meu
pai morava na Rua Oliveira Lima, na Boa Vista, quando a gente era criança,
andava-se na calçada e entrava na área do prédio, que era superlinda, com um jardim
e para um elevador. Quando a gente voltou, tinha uma grade. E, alguns anos
depois, fizeram uma guarita parecida com a de uma penitenciária. E, em Setúbal,
era a mesma coisa. Você entrava pela rua e ia andando até a porta do nosso
apartamento. Só que começaram a colocar barreiras. Um dia, fui sair de casa de
manhã para a universidade e tinha um cara dormindo na porta do nosso
apartamento. Aí eu percebi que estava todo mundo se fechando. Só que ninguém
percebia isso. Eu tinha morado quase cinco anos na Inglaterra com a janela
aberta, sem grade. E a minha janela, quando abri no Recife, tinha uma grade.
Quando fiz Enjaulado, uma mulher disse que aquilo era produção do filme. No
filme veem, mas na vida real não veem.
CONTINENTE Como foi que o jornalismo surgiu para você?
KMF Surgiu porque era a coisa mais próxima do cinema que
existia na época. Acho que, quando criança, nunca falei: “Quero ser cineasta”.
Mas eu queria trabalhar com cinema. E como o Recife, 40 anos atrás, era muito
distante de tudo, muito mais do que hoje, então acho que eu não tinha uma
possibilidade de pensar isso. Mas eu sempre era estimulado pela minha mãe a
pensar nesse sentido. Teve até um incidente, numa sala de aula, em que eu falei
que queria ser crítico de cinema. Isso foi antes de ir para a Inglaterra, em
1981 ou 1982. E o professor me deu um “Cala a boca, menino”. Contei pra minha
mãe e, no outro dia, ela foi à escola, chamou o cara e deu um baile: “Nunca
mais você fale com meu filho desse jeito. Você não tem a menor ideia do que
passa na cabeça dele”. Era a Escola Dourado, no fim de Setúbal. Mas eu não
quero que esse professor apareça na história como vilão. Ele já morreu, era um
grande professor de português. E me incentivou muito na escrita.
CONTINENTE Mas, e o jornalismo, como veio?
KMF Eu tinha uma visão romântica do jornalismo, pra mim era
o escritor que relatava, eu pensava em Hemingway. Essa visão era alimentada por
livros e filmes. E era tida como uma ideia de que eu escrevia bem. E aí era
péssimo em matemática. Considerei por alguns meses Arquitetura. Mas entendi que
não ia dar certo pra mim. Então, fiz Jornalismo. E, ao entrar no curso, a
melhor coisa aconteceu, encontrei muita gente que pensava mais ou menos como
eu, que estava gravitando em torno da ideia de fazer cinema, que, na época, era
algo inexistente. Em 1981, fui com minha mãe ao Veneza ver Caçadores da Arca
Perdida, entramos no meio e ficamos para ver a outra sessão. Foi incrível. Mas,
pensando bem, ele nunca me deu vontade de fazer cinema, porque era muito
espetacular, muito grandioso, tipo “Isso aqui não é pra mim”. Mas, quando
descobri, em VHS, Halloween, Assalto à 13ª DP e Fuga de Nova York, pensei “Isso
é muito bom! Talvez eu possa fazer algo assim”. Porque eles eram pequena
escalada. Eu não sei se alguma criança vê Star wars e diz “Eu quero ser
cineasta”. Outra coisa é que minha geração não cresceu vendo o que hoje nós
respeitamos muito do cinema brasileiro. Não tive oportunidade de ver Glauber
Rocha no São Luiz, no Veneza, no Parque.
CONTINENTE Glauber, você viu quando?
KMF O primeiro Glauber que eu vi foi no Channel 4, na
Inglaterra, O dragão da maldade contra o santo guerreiro. Fiquei orgulhoso de
ser brasileiro. A mesma coisa com Pixote. Fiquei orgulhoso e, ao mesmo tempo,
triste, de saber que aquilo era o Brasil. Eu não sabia que o Brasil era tão
horrível.
CONTINENTE Quando voltou da Inglaterra, você constatou que tinha crescido sem ver os filmes brasileiros?
KMF Mais ou menos. Mas aí tinha outro problema, que anulou
esse que você está falando. Quando entrei na universidade, e até 2002, com
Cidade de Deus, o cinema brasileiro era medido e pesado por tudo que foi feito
no Cinema Novo. Esperava-se que eu, um jovem que não sabia de nada, fizesse um
filme do Cinema Novo, porque, se eu não fizesse, ia ser tachado, ia ser
cobrado, e o que eu fizesse não ia ter valor. Quando fiz Enjaulado, que estreou
no Cine Ceará em 1997, a primeira crítica que saiu foi de um cara dizendo que
era um absurdo um realizador do Nordeste, “uma região tão forte em folclore”,
fazer um filme de paulista, dentro de um apartamento. Ou seja, isso era o
Cinema Novo ensinando a esse cara a como reagir a um filme brasileiro. Então, é
muito curioso que, nesses 20 anos, eu só fiz o contrário do que se esperava na
época. E aí esse contrário virou, aos poucos, a norma. Hoje, você vê Divino
amor, Permanência, País do desejo, Febre do rato. Nenhum problema em ser da
cidade. Isso acabou. É muito curioso ver que o início da grande produção
pernambucana era, de certa forma, inovadora e refrescante, mas ainda obedecia
às obrigações do cinema brasileiro da época. Baile perfumado (1996), Sertão e
cangaço. Cinema, aspirinas e urubus (2005), Sertão e cangaço. São filmes muito
bons, mas ainda obedeciam a isso. Aos poucos, a produção foi mudando. E quando
a produção mudou, o que a gente faz? Faz Bacurau, que é um filme no Sertão e
com cangaço.
CONTINENTE Você pode falar da importância da UFPE na sua formação cultural, daquele ambiente? Porque hoje estamos vendo um desmonte nas universidades públicas.
KMF Era um ambiente muito fértil, tinha gente de
Arquitetura, Artes Cênicas, Plásticas, Radialismo, era uma vibe boa no Centro
de Artes e Comunicação. Eu tive uma professora memorável, Nelly Carvalho. Inês
Amorim também, que encontrei em Portugal, em Vila do Conde. Ela foi ver Bacurau
do meu lado. E, claro, você faz muitas amizades, troca muitas ideias, sonha
muito nesses quatro anos. A universidade é formadora não somente do ponto de
vista acadêmico, mas do humano. Você constrói laços e de graça. Eu levei pau na
Católica e passei em terceiro lugar na Federal.
CONTINENTE Como foi que você começou na crítica?
KMF Fui para o Jornalismo quase por acidente. Passei um ano
sem trabalhar na área, depois que me formei. Ensinava na Cultura Inglesa. Ou
seja, não estava usando o talento desenvolvido na Federal. Até que, um dia, fiz
um curso com Alexandre Figueirôa, em 1991 ou 1992. Era um curso que teve na
Fundação Joaquim Nabuco, com Ana Catarina Galvão. Ele gostou de mim e me chamou
de fazer um teste no Jornal do Commercio. E eu escolhi escrever sobre o fim da
Rádio Rock, que passou um ano no Recife e depois acabou. Foi marcante. E aí a
galera me chamou pra ser do Caderno C. Comecei a escrever, e escrever sobre
cinema era algo natural para mim. Eu vinha muito influenciado pelos críticos da
Inglaterra na época. Ainda não lia o francês e, na Inglaterra, a crítica é
muito pragmática. Acho que meu estilo, no começo, era muito pragmático, muito
seco. Até um pouco cruel, admito. Coisas da juventude. E chamou muito a
atenção, de certa forma. Aí, fui ganhando uma ressonância.
CONTINENTE Quais os críticos brasileiros que eram referências para você?
KMF Quando voltei da Inglaterra, eu lia muito a Set, que era
a revista de cinema que tinha no Brasil, e Cinemin, uma revista carioca. Na
verdade, minhas referências desde criança eram Celso Marconi e Fernando
Spencer, porque eu ia comprar o jornal para ver a página de cinema, mas não via
só os textos, via também os anúncios dos cinemas. Aquilo estimulava muito a
imaginação, tinha os cartazes, dizia a censura, sessões. Mas eles eram
referências. A questão é que cada um escrevia em um jornal. Naturalmente, desde
criança, eu queria conhecer essas pessoas. E é bonito ver a trajetória de
Celso, Fernando, Ivan Soares e de Alex, que faleceu alguns anos atrás. É
basicamente a mesma coisa que aconteceu comigo: começa a escrever, depois vai
programar uma sala; no caso de Fernando Spencer, foi fazer filme. É como se
fosse um ciclo que se repete e sempre em torno da cidade.
CONTINENTE Quanto tempo você passou como crítico do Jornal do Commercio?
KMF Uns 13 anos. Eu sentia que tinha alguma ressonância, era
interessante. Mas aí foi junto com o trabalho na Fundação, que começou em 1998.
Ou seja, era uma imersão completa em cinema. Era uma coisa meio obsessiva. Eu
escrevia, então isso me deixava numa posição de estar sempre alertando e
anunciando o cinema. Comecei a ir pra Cannes em 1999 e lá via qualquer coisa
entre 38 e 44 filmes. Ou seja, você ficava alimentado para o resto do ano.
Então, o Cinema de Fundação já tinha todo o plano. Às vezes, eu ligava seis
meses antes do lançamento pra dizer que queria exibir um filme.
CONTINENTE Nesse momento, sua mãe já tinha morrido? Ela viu Enjaulado?
KMF Não. Ela faleceu em 1995. Ela viu algumas fagulhas
interessantes. Antes da morte dela, quando Pulp fiction saiu, naquela época
estava saindo também A fraternidade é vermelha. E aí tem uma cena em Pulp
fiction que eu achei a melhor de um filme de Tarantino e que não foi escrita
por ele. Foi escrita por Roger Avary, que fez Killing Zoe. A cena em que Bruce
Willis e Ving Rhames, inimigos mortais, estão se matando e vão parar numa loja.
E aparece um maluco, muito mais maluco que eles, pega os dois e os leva para um
porão. Um dos dois é estuprado. E aí esses inimigos agora precisam se unir para
sair daquela situação. E eu escrevi sobre A fraternidade é vermelha e essa cena
especificamente – lembro que minha mãe escreveu uma carta para mim, para que eu
lesse quando eu acordasse.
CONTINENTE Tem muita coisa dela nos seus filmes?
KMF Demais. Na verdade, eu deveria dedicar todos os filmes a
ela. Dediquei O som ao redor, por toda a questão histórica. Crescendo, ela
explicava as questões de racismo, de diferenças sociais. Tudo isso desde cedo
era muito explicado pra mim e pra meu irmão, de maneira que eu acho que em
outras famílias era tipo “Ah, mas é normal a empregada fazer isso”. Então,
dediquei O som ao redor a ela. Aí vou fazer Aquarius, que, na realidade, é ela.
Aquela mulher é ela. Claro que, por um verniz de cinema, mas a Clara é ela. No
final, Clara é ela e Sonia Braga, num Frankenstein estranho, mas é Sonia Braga
também. Sonia Braga é uma mulher extremamente interessante, forte, e é ela. Mas
minha mãe também. Aí tem Bacurau, que também tem um monte de coisa. Mas eu não
posso dedicar todo filme “para minha mãe”. Ela sabe que é pra ela.
CONTINENTE Essa ida para Cannes foi a primeira vez em que um jornalista pernambucano foi fazer essa cobertura?
KMF Foi a primeira vez que um jornalista foi especificamente
enviado por um jornal para fazer uma cobertura em Cannes. Em 1995, Alexandre
Figueirôa estava morando em Paris, fazendo o doutorado dele, e ele viajou para
Cannes e mandou algumas matérias para cá.
CONTINENTE Mas você foi o primeiro jornalista diretamente enviado do Recife, não é?
KMF O que é incrível, porque a imprensa tinha um ranço muito
provinciano e achava que bastava pegar e publicar matéria de agência.
Inclusive, eu ouvi isso dentro do jornal. Mas aí é que entra uma mulher foda
chamada Carole Scipion, diretora da Aliança Francesa na época. Ela me conhecia
e disse: “Vamos pra Cannes?” Ela chegou ao jornal, teve uma reunião lá e disse:
“Vamos pra Cannes”.
CONTINENTE Foi importante sua ida a Cannes, porque virou uma tradição.
KMF Essa ideia é quase uma filosofia de vida: faça um
negócio tão foda, que vai ser impossível depois alguém não querer de novo. E
teve um impacto. O próprio jornal fez uma medição com os leitores. Foi
superbem-recebido. Houve um avanço nas relações com a cultura, com o relato da
cultura.
CONTINENTE Era importante descentralizar a produção, mas também o olhar crítico.
KMF Esses últimos 20 anos trouxeram tanta coisa boa para o
audiovisual de Pernambuco, por tantos personagens diferentes, que acho que hoje
há algo como se as pessoas estivessem mimadas, sabe? Como se fosse normal
estrear um filme em Sundance, em Berlim, em Cannes. Eu lembro que, quando o
Baile perfumado ganhou o Festival de Brasília, foi uma Copa do Mundo. Eu ganhei
o Rio Cine com Enjaulado, um vídeo, Melhor Vídeo de Ficção. E saiu no NE TV. Hoje,
alguém pergunta: “Visse que vai ter um filme em Cannes?” – É, faz parte… Não
faz parte. Não é normal isso. Lembro quando Cinema, aspirinas e urubus e Vinil
verde foram para Cannes. Era uma coisa incrível. Um curta e um longa. Nunca
jamais um filme de Pernambuco esteve em Cannes e ali a gente tinha dois.
CONTINENTE Você foi pra Cannes esses anos todos como jornalista, levou Vinil verde, depois seus dois longas estrearam em Cannes.
KMF Eu acho incrível. Não paro de achar incrível. Ano
passado, na filmagem, os atores diziam: “Eu vou lá comprar minha passagem pra
Cannes”. E eu dizia: “Vocês são loucos? Como assim? Primeiro, tem que terminar
o filme, montar o filme, mandar pra alguém, pra, talvez, quem sabe, gostar do
filme”. – “Não, mas vai estar lá.”
CONTINENTE Mas antes, como realizador, você fez Enjaulado, em 1997, e depois A menina do algodão, em 2003.
KMF Na verdade, entre 1998 e 2002, eu dei 100% da minha
energia para o Cinema da Fundação e para a crítica. Deixei de lado a produção,
porque cansei. Porque, nos anos 1990, eu não aprovava nenhum edital. Nunca
ganhava. Eletrodoméstica era de 1994 e eu só filmei em 2004. Virou um filme de
época. O que eu achava estranho é que parecia uma piada. Quando tinha três
prêmios, eu era o quarto. Quando tinha um prêmio, eu era o segundo. Quando
tinha três prêmios, eu era o terceiro. Era uma coisa um pouco estranha.
CONTINENTE Mas a que você atribui isso?
KMF Eu não sei, porque era um edital muito provinciano, era
local, em que basicamente as mesmas pessoas participavam. Elas já conheciam o
roteiro. Mas acho que existia uma questão de hierarquia. Eu era tipo a ala mais
jovem. E tinha a ala mais velha.
CONTINENTE Ou será que existia um preconceito porque você era crítico?
KMF Talvez.
CONTINENTE Você está falando do Concurso Firmo Neto/Ary Severo, que era o edital que existia?
KMF Era. Aí comecei a ir para os federais também. Petrobras,
e também não ganhava. Até que, em 2003, ganhei o do Minc. Filmei em 2004. Nos
anos 1990, eu fiz só vídeo. E vídeo era tratado como o que eu chamava de
racismo de formato. Era subcidadão. O diálogo era meio assim: – Cê é cineasta?
– Sou. – E seu filme é qual? – É Enjaulado. – Massa. É 35mm? – Não, é betacam.
– Ah, é vídeo… Não é filme. É vídeo, pô.
CONTINENTE E tinha a palavra videasta.
KMF Videasta. E, aí, você chegava ao festival e entrava na
van com os curtas-metragistas de 35mm. – A gente vai te deixar primeiro na
pousada. – Ah, a gente não tá junto não? – Não, não, o pessoal do 35mm tá no
hotel. E você está na pousada. – Ah, ok. E a que horas passa o meu vídeo? – Vai
passar de três e meia da tarde na sala de aula da universidade. Mas tem que
sair antes, porque é meia-hora pra chegar lá. – E os curtas? Não, os curtas vão
ser exibidos à noite. O Cine Ceará era uma exceção. Era exibido no São Luiz à
noite. Só que o projetor era um quadro dentro da tela grande. Mas todos os
outros eram numa sala isolada. Aí eu fui me cansando disso, porque eu até fazia
filmes bons, mas ninguém via. Para um vídeo, Enjaulado foi um fenômeno. Mas,
quando assumi a Fundação, comecei a ter prazeres muito maiores com programação
e com escrita. E aconteceu uma coisa incrível: a revolução digital. Quando a
revolução digital chegou em 1999, na verdade chegou com Os idiotas e Festa de
família em Cannes, em 1998. Quando eu li no Jornal do Brasil, pensei: “Ah, é um
vídeo isso aqui, mas é tratado como filme. Isso é de que eu preciso”. Levou
dois anos pra essa revolução chegar na realidade do Recife. Em 2001, recomecei
a minha produção, em digital – que agora já era mais nobre, era cinema digital.
Aí, A menina do algodão virou cinema digital. E, então, há uma geração de
energia: quanto mais você faz, mais você faz. Quanto mais você não faz, mais
você não vai fazer nada. Aí veio A menina do algodão, veio Vinil verde. E, magicamente,
o Eletrodoméstica é aprovado no Minc.
CONTINENTE Para a realização do primeiro longa, como foi esse processo de deixar a crítica? Porque você era, talvez, o crítico mais badalado da cidade, imitado, as pessoas estavam na faculdade e queriam escrever como você.
KMF Na verdade, eu estava me sentindo… sabe burn out?
Entrando num processo de estafa, não era estafa física, mas me perguntava:
“Qual é o sentido de continuar emitindo opiniões sobre qualquer coisa?”.
Porque, às vezes, eram seis filmes por semana. Era tipo: “Kleber, são 30 linhas
sobre esses óculos aqui”. – Cara, esses óculos… Não sei o que dizer sobre esses
óculos. E isso foi me cansando. E aconteceu uma coisa incrível. Eu escrevi o
roteiro de O som ao redor em oito dias, num hotel em BH, pra mandar para um
deadline e mandei. Aí, ele ficou entre os 20 finalistas e não passou. Mandei o
roteiro pronto.
CONTINENTE Como é para você trabalhar com a mesma equipe, que vem desde O som ao redor, passa por Aquarius e chega a Bacurau?
KMF Existem questões muito delicadas na criação artística
que envolvem cultura e isso é muito importante para mim, na verdade, para toda
essa equipe de colaboradores. É muito delicado falar isso, mas, aqui em
Pernambuco, não é que a gente esteja em uma redoma, pois cada região tem um
jeito de fazer, de pensar e de agir. O jeito aqui é muito profissional, mas não
da maneira de uma cartilha de ser profissional. Tem muitos membros de equipe do
Rio e de São Paulo que parecem seguir uma cartilha do mercado de “como ser
profissional”. A gente não segue essa; a gente tem outra cartilha. Para eles,
que vêm de fora e veem a gente trabalhando, ficam encantados. Claro, tem os que
não ficam encantados e tentam lutar contra isso, e isso gera conflito. Isso
aconteceu em O som ao redor, em Aquarius e, de uma maneira maior ainda, até hoje,
em Bacurau. E de uma maneira muito intensa, porque a gente estava no Sertão e
lidando com pessoas que jamais haviam participado de um filme. Elas foram
tratadas com muito respeito e carinho e isso é importante dizer, pois a máquina
de fazer um filme às vezes tritura pessoas. Tem gente que acha isso normal, mas
não, não acho que faz parte. Não é preciso triturar e machucar as pessoas.
Prefiro evitar isso. Não acho uma boa e muita gente da equipe também concorda.
Fazer um filme é muito tenso. Não gosto de gente que artificialmente acrescenta
tensões em cima das tensões que já existem.
KMF Até agora, não vejo esse sofrimento de que ele fala.
Mas, pelo que já li da história do cinema, é algo totalmente viável e possível
de acontecer. Consigo entender como isso pode acontecer, mas, tirando as
tensões e preocupações inerentes ao processo de fazer um filme, eu não tive
ainda esse sofrimento.
CONTINENTE Alguma ansiedade?
KMF Ah, ansiedade sempre. A principal ansiedade é se vale a
pena esse trabalho todo. É um esforço físico fazer um filme, uma prova de
saúde: você passa oito semanas e cinco dias no Sertão, e todo dia está bem,
pulando, com muita saúde. Acho isso incrível, de verdade. E ainda não tive
nenhum momento miserável fazendo um filme, mas tenho certeza de que pode
acontecer. O que acontece, e muito, são preocupações. Em Bacurau, por exemplo,
a gente perdeu três dias por causa de tempo ruim. Imagina você estar de braços
cruzados, vendo uma tempestade e o dinheiro indo embora… Cada dia parado era,
sei lá, R$ 90 mil. No dia seguinte, outra tempestade: mais R$ 95 mil. Isso dá
uma agonia, mas a gente é ninja e conseguiu não perder nenhuma cena. Teve
alguns momentos em que fizemos algo que deu certo. Por exemplo, Juliano foi
para um lado e eu fui para outro. Tudo é difícil, na verdade. Tudo era difícil,
mas, ao mesmo tempo, tudo deu certo. Um filme sempre tem muitas peças. É feito
um Lego. Imagina que você compra um Lego gigante e “Caralho, vou ter que montar
isso agora, não vai dar certo”, e você leva muito, muito tempo para montar.
CONTINENTE Os finais dos seus filmes trazem a sensação de um soco: o confronto entre os personagens de Irandhir Santos e W.J. Solha, no final de O som ao redor; Clara indo na construtora em Aquarius e o desfecho de Bacurau. Como é essa construção dentro do próprio filme? Você pode falar do processo de como você pensa a narrativa e estrutura tudo para chegar a esses finais?
KMF Acho que deve ter um senso de showmanship, de você
querer dar um certo prazer de espetáculo à narrativa. Isso está na literatura,
na música… Você não pode ouvir Bohemian rhapsody e achar que tudo aquilo
acontece porque ele estava simplesmente sem fazer nada numa terça-feira. Aquilo
é espetáculo, feito para… Fico arrepiado só de falar. Não é normal. Claro, tem
umas folk songs que o cara fez quando estava deitado e é maravilhoso. Bob Dylan
tem muita coisa assim e ele é um talento especial. Acho que a narrativa tem que
ter um final, mas também um bom início. Fico um pouco pasmo que alguns filmes
começam no nada e terminam no nada. Às vezes, o filme não é tão ruim, mas podia
ter alguma dinâmica. Dinâmica é muito importante na narrativa. Agora que estou
nesse momento da minha vida em que conto histórias para crianças de cinco anos,
vejo que as grandes histórias, todas elas, têm uma dinâmica. Elas começam,
geram uma curiosidade, você vê as crianças fazendo assim (abre os olhos) e aí
começa a explicar e elas vêm e fazem assim (mexe com os ombros, inclinando-se
um pouco para frente) e tem outro ponto e elas já reagem diferente. Isso pra
mim é clássico, vem desde os gregos, não há nada de novo. Mas, sim, acho que os
finais são muito importantes. E, para chegar aos grandes finais, você tem que
os ter construído. Tem gente que fala que, em Aquarius e em Bacurau, leva uns
30 minutos para… “Mas quando chegam os 30 minutos, a coisa fica boa”, me dizem.
Eu acho que os 30 minutos são bons também. Você está ali, apresentando as
pessoas. Tem que apresentar o lugar.
CONTINENTE Uma pergunta com relação a roteiro: você é muito rigoroso ou o roteiro pode ser modificado durante a filmagem?
KMF Sou rigoroso para ele ficar muito bom e você ler e ficar
muito entusiasmado. Ele pode ser modificado, e muitas vezes é. Por exemplo, a
cena em que Tony Jr., prefeito no enredo de Bacurau, visita a comunidade, foi
reescrita na segunda semana de filmagens, Porque, do jeito que estava no
roteiro, ia levar quase uma semana de filmagem. E a gente não tinha esse tempo.
E aí eu disse: “Só vou reescrever se ela for ficar menor e melhor”. Acho que
ficou melhor.
CONTINENTE Mas tem algo que você e Juliano falaram anteriormente sobre Bacurau: que o mote surgiu quando vocês estavam em um festival de cinema e ficaram incomodados com o modo com que as pessoas que estariam nesse festival se relacionavam com os personagens de um documentário em exibição.
KMF Alguns filmes, documentário e ficção, mostram pessoas no
Nordeste sendo tratadas como pessoas simples. Sou muito sensível a isso, e
Juliano também, porque nós somos do Nordeste. Vocês já devem ter passado por
momentos assim no Sul e no Sudeste… Preconceito é a palavra correta.
CONTINENTE Como se fosse uma caricaturização dos nordestinos.
KMF Isso. Uma vez eu fui ao Copacabana Palace para uma
junket da Dreamworks (evento de lançamento para filmes de grande porte, em que
geralmente se convidam jornalistas do país inteiro para ver a obra e depois
entrevistar a equipe). Chego lá no final do corredor e tem duas assessoras de
imprensa de São Paulo cuidando da junket. Dou meu nome: “Kleber Mendonça, do
Jornal do Commercio”. Aí ela diz: “Ah, Kleber, bem-vindo. Você vai precisar de
tradutor, né?” (imitando sotaque paulista). Eu: “Não, não, eu falo inglês”.
“Pô, bacana, pessoal do Recife falando inglês!” (novamente em sotaque
paulista). Essas coisas você vai acumulando ao longo de muitos anos, e, sabe
como é? É normal, é brincadeira, mas é estranho, muito estranho. Acho que
mostra muito como funciona a lógica do país. Isso está em Bacurau, numa cena
que é forte, quando alguém diz: “A gente é feito vocês”. A resposta: “Mas eles
são brancos e vocês não são brancos”.
CONTINENTE Nesse último tiroteio em massa nos Estados Unidos, em El Paso, no Texas, uma parte da imprensa se apressou em dizer que o assassino tinha uma doença mental, mas depois se descobriu que ele tinha viajado nove horas apenas para chegar mais perto da fronteira com o México e assim poder matar mais “pessoas de cor marrom”. E ele era branco. Se fosse negro, ou árabe, poderia ter morrido e já seria um terrorista.
KMF Eu devo me isolar para escrever um roteiro novo e acho
que, dessa vez, vou me fechar das redes. Mas, para Bacurau, a gente achava até
importante estar conectado o tempo todo. Às vezes, era um problema, com a perda
de tempo e procrastinação, mas estar aberto à permeabilidade nos dava acesso a
informações constantes do mundo. Muito do que entrou no filme vem dessa relação
muito forte de violência enraizada na sociedade americana, que, de nenhuma
maneira, deve ser vista como um resumo dessa sociedade. Os Estados Unidos são
uma sociedade extremamente complexa, e todos nós nos alimentamos dos Estados
Unidos: eles têm uma cultura riquíssima na música, na literatura, mas é
inegável que tem uma história de violência, até com a comercialização dessa
violência, e isso veio muito no roteiro. Uma história como essa de El Paso é
fascinante. Não só isso: quando o cara é branco, não é terrorismo, é doença
mental, ou um massacre puro e simples. Na Boate Pulse, na Flórida, quando um
árabe que não lidava bem com sua sexualidade fez aquele massacre, era
terrorismo. Isso tudo entrou no roteiro, com propriedade. Eu não sou americano,
mas sei o que está acontecendo. Juliano não é americano, mas também sabe, e as
narrativas são muito impressionantes, porque têm uma carga cultural, política,
de raça e religião. E produtos desenhados para matar gente.
CONTINENTE Isso tudo está em Bacurau: aquelas pessoas acham que têm o direito de estar ali para caçar outras pessoas. Essa é uma discussão que a gente pode trazer para o cotidiano do Brasil, tendo em vista que a Polícia Militar entra numa favela do Rio de Janeiro e um bebê de um mês morre vitimado por uma bala perdida. É como se fosse um efeito colateral.
KMF Uma pessoa branca de classe média morta num assalto é
capa. Seis meninos negros mortos numa comunidade, num sábado à noite, é
contracapa. E embaixo. Esses pesos diferentes para violência são a base da
escrita de Bacurau. Uma comunidade inteira dizimada… Por que não? Mas a
comunidade matar todos eles e cortar suas cabeças, “Ah, que absurdo,
selvagens!”.
CONTINENTE Vocês viajaram muito para escolher a locação de Bacurau?
KMF A gente viajou muito e a gente precisava de uma
comunidade isolada, de uma rua. Sobre essa ideia do Sertão: meu terror era
escrever uma coisa de turista e na verdade chegar lá e ver que não é assim.
Mas, quando a gente visitou o Sertão, não só agregou coisas novas, como
confirmou muitas outras, como o senso de comunidade, a inteligência, como as
pessoas eram antenadas, a visão política que elas têm. E trabalhar com 100
figurantes da região nos ensinou muito. Eles não só nos ensinaram, como até em
cenas de que estavam participando sem receber exatamente um briefing completo;
só de olhar para a cena, aquelas pessoas sabiam exatamente o que estava acontecendo,
pois aquilo ali fazia parte da vida delas. Meu maior medo era inventar uma
coisa de “menino de cidade”, mas isso não aconteceu. Aconteceu uma coisa: não
chovia há oito anos e, quando a gente começou a pré-produção, começou a chover
como não chovia há muitos anos. E aí, bum!, tudo verde, uma explosão
hollywoodiana de natureza. Que massa, então, vai ser esse o Sertão.
CONTINENTE Quando esse roteiro foi fechado? Porque tem muita coisa atual.
KMF A gente fechou na segunda semana de março do ano passado.
Mas alguns detalhes entraram na mixagem e na montagem. Por exemplo, na montagem
entrou a leitura de nomes no final do confronto, em um aceno a Marielle Franco
(vereadora carioca negra assassinada em março de 2018, no Rio de Janeiro).
Quando Sônia veio filmar, Marielle tinha morrido três semanas antes. Tinha
estado com Marielle e estava muito impactada pela sua morte. A morte de
Marielle é a execução de uma mulher negra, que tinha um posicionamento social e
político forte e que foi assassinada de maneira profissional. É impossível
essas coisas não estarem no filme. Acho inacreditável você fazer um filme no
qual o Brasil não está. Aí você vai falar com o diretor e com a diretora, e
eles: “Mas você não viu que tem um chapéu vermelho ali no fundo, atrás”. – Não,
não vi. “Ah, mas aquilo representa o Brasil”. Não, não, a gente precisa de algo
mais forte nesse tempo de subtração de direitos.
CONTINENTE Falando nisso, qual a forma de driblar o desmonte no cinema?
KMF Se você pensar em termos do que é normal no mundo, que é
o governo apoiar a cultura, acho que é um desafio muito grande. Porque, se eles
querem cortar, vão cortar. Mas eu diria que é um momento muito importante para
jovens partirem para fazer filmes muito provocadores, bem fortes, com o mínimo
de equipamento. Estamos em um momento fantástico para isso. Com uma câmera
dessa (aponta para a câmera do fotógrafo Breno Laprovitera), você faz um filme
de muita qualidade, aí leva pra casa e edita no seu colo. Literalmente nas
coxas (risos). E faz um filme foda. Gostaria de ver uma reação nesse nível, de
cineastas homens e mulheres jovens fazendo filmes muito simples e muito fortes.
Porque hoje o Brasil tem todo tipo de filme. Eu fiz A menina do algodão com R$
78 e fiz Bacurau com 8 milhões de reais. Bacurau é um tipo de filme e A menina
do algodão é outro. Vinil verde é um tipo de filme e As boas maneiras é outro,
e os dois são de gênero, são brasileiros. Então, acho que é um momento bom para
reagir. Agora, em relação ao cinema feito com estrutura comum, normal, me
parece que há uma real ameaça nesse sentido. Hoje, o cinema brasileiro é muito
diverso: em orientação sexual, em temas, regionalmente. Você tem todos os
diretores fazendo filmes em Pernambuco, o Ceará fazendo filme, os meninos de
Contagem, em Minas Gerais, gente de Curitiba… Tá diverso de uma maneira que
nunca foi. E é exatamente agora que esse cinema começa a ser desmontado. Porque
um filme pernambucano, filmado com lentes Panavision, de aventura, mas que é
meio estranho, vai para Cannes e ganha prêmio lá é uma prova dessa diversidade.
CONTINENTE A sua carreira está ameaçada nesse sentido? Porque existe essa perseguição, essa cobrança para devolver mais de R$ 2 milhões relativos a O som ao redor.
KMF A minha, eu espero que não. Isso faz parte de um momento
triste que a gente está vivendo agora e é algo completamente sem precedente na
história do MinC e da realização de cinema no Brasil. Nunca aconteceu com um
filme que existe, que foi entregue. Aconteceram algumas cobranças com relação a
filmes que nunca foram feitos, o que acho até normal que aconteça, mas isso é
uma ação de extorsão em um momento terrível do Brasil, contra os artistas. O
que me faz dormir bem à noite é que não sou o primeiro artista a ser perseguido
nem vou ser o último. É curioso que nesta entrevista a gente esteja falando de
toda uma trajetória, de quando eu era criança, dos anos 1980… Estou há 25 anos
fazendo cinema, tudo público e aberto, sempre claro, e nada mudou no que eu
faço, exceto que eu vou fazendo cada vez mais. Tem o Janela Internacional de
Cinema do Recife (festival criado por Kleber e Emilie Lesclaux em 2008), tem o
trabalho com a imprensa, tem os filmes que faço e todo filme que faço gera mais
energia. A única coisa que mudou foi o Brasil. É um pouco suspeito que a única
coisa que mudou foi o país. E é exatamente quando o Brasil muda, e assume
atitudes que não são democráticas, que um negócio desse aparece com relação a
um artista como eu, que sempre fez tudo da maneira mais clara, até com
repercussão internacional. Enfim, a gente está em um processo judicial, com
advogado.
CONTINENTE Isso vai para onde, para o STF?
KMF Imagino que sim. Mas é o equivalente a você ser
assaltado pelo seu país.
CONTINENTE O que o MinC alega? Que vocês receberam recursos e havia um teto que não poderia ser complementado com incentivo de outra fonte, é isso?
KMF O edital do qual a gente participou, a gente e vários
outros projetos, tinha uma abertura de interpretação, que foi esclarecida com a
Ancine e com a Secretaria do Audiovisual, e que as duas disseram: “Sim, é fato,
vocês podem complementar com dinheiro, mas não federal”. Então a gente usou
dinheiro do Estado de Pernambuco, outros projetos complementaram com dinheiro
municipal, e isso tudo foi documentado e arquivado e estava tudo certo. Quando
entrou o governo Temer, entraram pessoas que não acreditam no estado como
apoiador da cultura. O alvo mais fácil de fazer alguma coisa fui eu, até pelo
sucesso dos filmes.
CONTINENTE E talvez também pelo protesto feito em Cannes, em maio de 2016?
KMF Tenho um orgulho enorme do protesto que a gente fez, mas
isso já vinha rolando ao longo de um ano dentro da Ancine, por parte de uma
pessoa que criou essa situação dentro de um laboratório. Porque já existia uma
guerra interna lá, uma guerra de narrativas, pois ela, nos últimos anos, tinha
estado no período Manoel Rangel (diretor-presidente da Ancine entre 2006 e
2017), então tinha uma coisa de inimizade.
CONTINENTE Você vai dizer quem é essa pessoa?
KMF Eu não posso falar aqui, mas vocês deveriam ir atrás.
Aí, quando o MinC virou golpista, eles pegaram isso e simplesmente deram
continuidade, mesmo não fazendo o menor sentido. Qualquer sentido. Até porque o
filme foi entregue, sem falar de que todos os outros filmes, que fizeram o
mesmo procedimento legal, nenhum deles está sendo investigado.
CONTINENTE Isso já estava sendo gestado ao longo de 2015?
KMF É, mas o que aconteceu mesmo foi quando mudou o
ministério e ele passou a ser um MinC golpista.
CONTINENTE Pegando a lembrança do protesto, queríamos que você falasse da importância de ir para Cannes naquele ano. Você era crítico, ia para o festival sempre e, de repente, estava lá como diretor de um filme brasileiro na competição.
KMF Eu conhecia Cannes durante todos os anos como crítico,
conhecia todas as portas e salas e todo o jeito de Cannes operar e agora estava
lá com um filme, vendo todas as portas do outro lado. Isso foi muito forte,
estar lá com os meus amigos, tendo feito um filme tão pessoal, infelizmente num
mês terrível para o Brasil, quando os ritos democráticos estavam sendo
abandonados. A imprensa internacional não estava sabendo, não estava entendendo
nada. Na verdade, a imprensa internacional estava repetindo o que saía na
imprensa nacional, botando no Google translator. Acho que o protesto alertou,
dizendo “se liguem”. Vários jornalistas vieram me falar isso: “A gente não
tinha noção do que estava acontecendo, agora a gente tem”. Que bom que Aquarius
foi parte de um momento histórico e é curioso como sobreviveu ao protesto. O
filme poderia ser só o protesto, mas ganhou vida própria e seguiu uma carreira.
CONTINENTE Três anos depois, com Bacurau em Cannes, você decidiu não fazer nenhum protesto oficial?
KMF Não, porque quando o filme foi anunciado em Cannes, toda
a imprensa fazia a mesma pergunta: “Qual vai ser o protesto?”. Parecia que eu
era o cineasta do protesto. E eu lembrava muito do Los Hermanos: “Vai tocar
Anna Júlia?”. “Hoje vai ter Anna Júlia?”. E, na verdade, todo mundo sabe o que
está acontecendo no Brasil. A imprensa internacional está dando, até melhor do
que a daqui.
CONTINENTE Que tipo de espectador você é com seus próprios filmes?
KMF Faço os filmes que gostaria de ver. Isso vem de uma
formação, de muitos anos indo ao cinema. Tenho memórias afetivas de grandes
sessões de cinema que vi, às vezes sozinho, às vezes com outras pessoas, e
quero repetir um pouco daquele sentimento – como acontece sempre com os
artistas, sempre tem uma tentativa de volta. Lembro quando fui ver Robocop
sozinho no São Luiz, em 1987, e era o filme perfeito de ação, mas ao mesmo
tempo era algo muito especial porque não era normal. Era isso que eu queria
fazer: um filme anormal. Bacurau é totalmente brasileiro, mas, ao mesmo tempo,
tem alguma coisa ali que não é muito comum. Não sei se é a imagem, a câmera, a
violência, alguma coisa que nos atraía muito, eu e Juliano, e a gente queria
mostrar nesse filme algo que não era normal. Algo que talvez vocês já tivessem
visto, mas não daquele jeito.
CONTINENTE As imagens do filme trazem mesmo uma reincidência afetiva, que nos leva a filmes já vistos, mas também traz ecos do Sertão, do cangaço, que é tão nosso, e tem a referência literal das cabeças cortadas, mas também o senso de comunidade.
KMF Algumas pessoas se apegam a essa ideia do cangaço, por
causa das cabeças cortadas, mas é incrível o que aconteceu durante a escritura
do roteiro e na semana passada: quando se tem uma rebelião nos presídios no
Brasil, são arremessadas 14 cabeças e algumas viram bola. Não tem nada a ver
com o cangaço, tem a ver com o Brasil. Quem sabe Lunga, personagem de Bacurau,
e o bando dele não passaram um tempo, dois anos numa penitenciária, e lá viram
esse negócio acontecer e, quando eles estavam em Bacurau, pensaram “eu vou é
cortar cabeça também?” Não é só o cangaço, é muito mais complexo. Teve uma
pessoa que viu o filme e veio me dar aula: “Olhe, mas o cangaceiro não cortava
cabeça, quem cortava era a volante”. É mais complexo do que isso tudo, pois a
sociedade brasileira é violenta demais e agora parece que perdeu o pudor. Essa
da rebelião em Altamira (no Pará, ocorrida em 29 de julho) foi relatada sem pudor.
Caralho… Decapitados? Sob tutela do Estado?
CONTINENTE O que você achou dessa mudança nos critérios para seleção ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro? Agora vão ser nove indicados. Você foi prejudicado no ano de Aquarius.
KMF Acho ótimo, mais chance. Aquilo foi estranho. Um
harakiri.
CONTINENTE Qual o impacto que um Oscar tem, na realidade?
KMF Incrível, é muito assustador. Para a divulgação do
filme, é gigante. Não sei se depois que a pessoa ganha tem algum impacto,
talvez para o próximo projeto. Porque tem muito realizador que ganhou Oscar e
não aconteceu nada. Mas, para divulgação, é algo gigantesco. É o que a grande
massa entende como cinema. Cannes é bem importante, mas o Oscar… outro nível.
CONTINENTE Você é uma pessoa muito presente nas redes sociais. Sofre com haters?
KMF Não, mas às vezes aparece um e, em três segundos, a
pessoa está bloqueada. Crio um Reino da Carochinha… Minhas redes sociais são o
Reino da Carochinha, só gente que concorda comigo (risos). Isso é bom para a
saúde mental. É bom para não ter que acordar e ver um cara que postou a
execução de um cachorro no Facebook. Isso faz mal. Então, no início do
Facebook, eu já via isso e bloqueava a pessoa. Não que ela postasse para eu
ver, mas é o tipo de gente que acha execução legal, que gosta de agressões. Na
semana passada, apareceu uma doidinha, ainda fui paciente, mas depois vi que
era bolsominion mesmo e bloqueei. Essas pessoas trabalham com marcadores de
realidade. A gente está aqui no Café Santa Clara, a pessoa aparece e diz: “Está
de noite lá fora, são 20h, os carros estão passando com a luz acesa”. Mas não
está de noite, são 11h50 e o sol brilha lá fora. É isso o que está acontecendo
no Brasil, é sobre isso que Antônio Prata escreveu. Quando a Folha de S.Paulo
fala que Bolsonaro é polêmico, não, ele não é polêmico, ele é um escroto,
idiota, mentiroso e filho da puta. Isso é o que ele é. Ele não é polêmico. Usei
as redes sociais para escrever o roteiro de Bacurau e vou sair agora para me
isolar, para escrever um outro roteiro. Porque esse roteiro se passa em 1970,
não preciso de rede social para falar sobre como era 1970; preciso ir para o
Arquivo Público, ver arquivos de foto, ler livros. Mas, para Bacurau, foi
superimportante ver que tinha uma matéria no New York Times sobre um grupo de
soldados no Afeganistão que saiu atirando em civis. Que não tinha nada melhor
para fazer, pois estava achando tudo monótono, chato pra caralho, e isso foi
interessante para o projeto. Quando você está escrevendo, descobre que o
vocabulário da maldade humana é muito maior do que a gente pensa.
CONTINENTE Quem seria o cineasta que você gostaria que visse Bacurau?
KMF Não sei se tenho fetiche de determinado cineasta para
ver meu filme. Talvez John Carpenter. Ele estava em Cannes no mesmo dia em que
a gente ia apresentar o filme, mas estava recebendo um prêmio. Mas, no fundo,
acho que tenho medo. Ele é um velho meio rabugento.
------------------------------------
Extra: Confira Homem de projeção (1992), Enjaulado (1997), A
menina do algodão (2003), Vinil verde (2004, na foto), Eletrodoméstica (2005) e
Recife frio (2009), alguns dos curtas-metragens de Kleber.
-------------------------------------
DÉBORA NASCIMENTO, repórter especial da Continente e colunista do site da revista.
LUCIANA VERAS, repórter especial da Continente.
Texto e imagem reproduzidos da revistacontinente.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário