Crítica: Os Brutos Também Amam (Shane, 1953)
Por Alexandre Koball
Avaliação: 8.0
Uma das obras-primas do gênero faroeste, com um vilão muito
bem construído.
Shane, o personagem de Alan Ladd, apresenta-se ao espectador
como alguém totalmente misterioso. Cavalgando por uma belíssima planície, ele
encontra a família Starrett, colonos que sonham em possuir uma fazenda para seu
auto-sustento e acabam convidando Shane para trabalhar para eles. Assim
conhecemos nosso herói, que neste faroeste é cheio de problemas e foge bem do
estereótipo de herói invencível e auto-confiante encontrado na média de filmes
do gênero.
Um fato curioso é que, durante todo o tempo, não ficamos
sabendo praticamente nada da vida anterior de Shane. Talvez não seja
necessário. Como outro clássico do gênero, Sete Homens e um Destino (dirigido
por John Sturges, de 1960) bem demonstrou, a vida desses heróis errantes é
solitária e triste, e é assim que Shane comporta-se durante todo o filme. Mesmo
com todo carinho e aceitação da família Starrett, ele não consegue perder as
feições de um homem que é infeliz. Isso o transforma em um personagem bastante
especial e identificável. Não é apenas o herói infalível dos filmes de
faroeste. Embora seja óbvio que ele tem grandes habilidades com a pistola, o
espectador confirma isso (ou não) apenas no final do filme.
Configurando-se mais como um drama do que como um filme de
ação com grandes duelos, Os Brutos Também Amam foi certamente uma grande
inspiração para muitos filmes posteriores. O clássico moderno Os Imperdoáveis
tem características muito semelhantes a ele, citando um exemplo (como a
confrontação final, que é muito parecida). O filme também chega a arriscar
outras vertentes, com temas como adultério (uma leve insinuação, que pode
passar desapercebida por muitas pessoas) e coragem (nunca desistir do que é seu
e do que você considera o certo – há vários exemplos motivadores).
Temos também um personagem muito interessante: o garotinho
Joey, interpretado pelo ator Brandon De Wilde. Brandon tinha 11 anos na época
de lançamento do filme, e muitos críticos consideram que ele roubou a cena de
Alab Ladd, o protagonista do filme. Brandon foi indicado ao Oscar no ano
seguinte por seu papel, onde ele passa o filme todo idolatrando Shane. Brandon
conseguiu algo bastante difícil: levar sua carreira adiante em um status
bastante elevado durante sua adolescência e início da idade adulta, atuando em
um bom número de filmes, mas acabou morrendo em um trágico acidente de carro
logo aos 30 anos de idade. Poderia, quem sabe, ter se tornado um dos grandes
nomes de Hollywood.
Além de Brandon, o filme arrecadou outras cinco indicações,
incluindo melhor filme e direção para George Stevens, mas acabou vencendo
apenas melhor cinematografia a cores que, por sinal, é realmente esplendorosa.
É um dos faroestes mais bonitos que existem, para falar a verdade. As planícies
quase sem fim se encontram muito ao fundo com lindíssimas montanhas cobertas de
neve, enquanto verdes pastos e belas casinhas rústicas servem de locação para a
história. A sensação de liberdade apenas não é maior por causa do vilão do
filme, que quer expulsar os colonos (entre eles a família Starrett, a mesma que
acolheu Shane em sua casa durante sua passagem por suas terras) do vale e tomar
para si as terras.
Aqui chegamos a outro ponto forte do filme. O vilão (Ryker)
é muito bem caracterizado e sabe justificar muito bem seu comportamento, em um
discurso bem ensaiado de direitos. Ele é tão convincente que pode até mesmo
gerar dúvidas se pode não estar certo. Além do quê Ryker não é apenas um vilão
inescrupuloso: ele se importa com a lei e tenta expulsar os colonos sem
quebrá-la. Para isso contrata o pistoleiro Wilson (Jack Palance), este sim um
personagem sem muita profundidade que está lá apenas para causar preocupação
nos colonos – ele fala muito pouco durante todo o filme, mas causa impressão
forte devido ao seu porte, fazendo de sua figura uma ameaça constante por onde
quer que ande. O filme, claro, tem também uma mocinha, Marian, interpretada por
Jean Arthur, atriz que fez muitos filmes maravilhosos como A Mulher Faz o
Homem, de Frank Capra. Ela não é uma típica e irritante mocinha de faroestes,
tipo que se caracteriza por ser chata e arrogante (veja minha crítica para Rio
Vermelho), e sim uma mulher de valores e que causa simpatia no espectador.
Os Brutos Também Amam é uma adaptação do romance de Jack
Schaefer e um dos grandes faroestes que Hollywood já produziu. Não apresenta
nada de realmente novo para o gênero, mas é desenvolvido em cima de personagens
e valores bem fortes, além de ser lindo e, às vezes, emocionante de ser
assistido. O filme possui algumas falas memoráveis que hoje são famosas (“- Uma
arma é uma ferramenta, Marian. Não melhor nem pior que qualquer outra
ferramenta. Um machado ou uma pá ou qualquer coisa. Uma arma é tão boa ou tão
ruim quando o homem que a usa. Lembre-se disso.”). Se há um ponto fraco
marcante é a falta de uma trilha sonora melhor, ou pelo menos um tema marcante,
como o encontrado em Matar ou Morrer, filme da mesma época. Ainda assim, Shane
é um faroeste mais que obrigatório para os amantes do bom cinema.
Por Alexandre Koball, em 11/11/2004
Texto reproduzido do site: cineplayers.com
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