Crítica do filme: “Intocáveis”
Por Eleonora Rosset
Uma Maserati dirigida à toda, costura o trânsito à noite nas
ruas de Paris. A polícia persegue o motorista infrator com estardalhaço.
Dentro do carro, ao volante, um jovem negro e um senhor de
barba se entreolham com cumplicidade.
“- Você está em forma”, diz o senhor, apreciativo.
“- Aposto 200 como eles nos escoltam”, responde o rapaz
negro de olhos sorridentes.
Quando a polícia os encurrala e o negro é jogado sobre o
capô da Maserati, o mais velho começa a ter uma crise epiléptica dentro do
carro.
“- Vocês estão loucos? Por que acham que eu estava correndo?
Ele está doente! Tenho que ir para o pronto-socorro!” grita o rapaz negro para
o policial.
E, na cena seguinte, ao som de uma música de discoteca anos
70, a dupla se diverte, cantando junto aos berros enquanto o negro dança ao
volante, escoltados pela polícia até o hospital.
Passam os créditos na tela e ficamos sabendo que a história
que inspirou o filme é real. No final, aparecem os dois verdadeiros
protagonistas. Prestem atenção.
Mas, logo, o que nos cativa é o humor com que essa história,
de uma dupla surpreendente, é contada.
Um acidente trágico de “parapente” levou Phillippe (o
excelente François Cluzet) a uma cadeira de rodas. O tetraplégico milionário,
que mora em um “hôtel particulier”, uma mansão luxuosa, precisa que façam tudo
por ele, 24 horas por dia. Ele é inteligente, culto, bem educado. Mas o que é a
vida sem um algo a mais que a torne interessante?
É aí que entra Driss, um jovem negro da periferia de Paris,
ex-presidiário, desempregado, que tem alegria de viver de sobra.
Se Phillippe não tem como se movimentar e já perdeu as
esperanças de algo que o faça vibrar nessa vida, Driss enfrenta dificuldades
para sobreviver mas, apesar disso, não perdeu seu jeito bem humorado de ser.
Ele entra na vida do outro como uma rajada de forças novas que Phillippe vai
saber apreciar.
“Intocáveis” é a história desse encontro, onde dois
universos tão diferentes se harmonizam, criando um terreno fértil para uma
forte amizade.
Haverá uma troca que beneficiará os dois amigos.
Driss vai ser não só as pernas e braços de Phillippe mas
também sua curiosidade e coragem. E Phillippe vai ampliar os horizontes de
Driss, apresentando a ele um mundo que ele não conhecia. Será seus olhos e
ouvidos abertos para o novo. Mas tudo isso sempre com humor. E nem sempre
politicamente correto. Ainda bem. O roteiro dos dois diretores, Toledano e
Nakache, tem o bom gosto de não fazer julgamentos nem ser moralista.
Mas “Intocáveis” não seria um filme tão bom e simpático, se
não contasse com Omar Sy e François Cluzet como a dupla de amigos.
Não foi à toa que o jovem senegalês de 34 anos levou o César
de melhor ator francês, concorrendo com ninguém menos que Jean Dujardin, o
ganhador do Oscar americano. Alto, bonito, com um corpo expressivo e ágil, ele
sabe fazer rir e comove com a mesma intensidade.
François Cluzet que consegue a façanha de contracenar com
essa explosão de forças da natureza que é Omar Sy, apenas com a expressão de
seu rosto, foi a escolha acertada para ser o outro da dupla.
Eu torço para que o cinema francês de qualidade conquiste
cada vez mais o espectador brasileiro, viciado em “blockbusters” americanos.
Faça como eu e mais de 40 milhões ao redor do mundo e vá se
encantar com “Intocáveis”.
Texto reproduzidos do site: eleonorarosset.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário