Nova musa - Jeanne Moreau em "Jules e Jim –
uma Mulher para Dois", de Truffaut:
triângulo amoroso narrado com inventividade
Publicado originalmente na revista ISTOÉ, em 03/06/09
A nouvelle vague, 50 anos depois (2009)
Nos tempos atuais dos blockbusters e dos efeitos especiais,
o ideário do movimento francês sobrevive nos jovens artistas
A nouvelle vague, 50 anos depois
Por Ivan Claudio
O Festival de Cannes, na França, é o evento cinematográfico
mais importante do mundo e em sua mais recente edição consagrou o filme "A
fita Branca", do diretor austríaco Michael Haneke. Devido à sua Palma de
Ouro, o longa-metragem será exibido no mundo inteiro. Tratase de um feito
pequeno demais quando comparado ao que se passou nesse mesmo festival em maio
de 1959.
Naquele ano, o prêmio máximo foi dado a um filme produzido
com pouco dinheiro, em preto e branco e com atores desconhecidos. Seu diretor
era um estreante e tinha apenas 28 anos. Mas a história narrada, sobre um
garoto mal-amado pelos pais, revolucionou o cinema mundial. Estamos falando do
cineasta francês François Truffaut e do clássico "Os Incompreendidos"
– e os dois entraram para a história porque, a partir daquele dia, passou a
existir um movimento chamado nouvelle vague. Nascida nas páginas da revista
Cahiers du Cinéma, essa "nova onda" reunia jovens diretores que
praticavam a crítica de filmes e seu ideário poderia ser resumido pela frase de
Jean-Luc Godard, o integrante mais polêmico do grupo, autor de
"Acossado": "O cinema é a verdade a 24 quadros por
segundo."
Sob esse lema, que condenava as superproduções afetadas,
feitas em estúdio e com diálogos literários, os jovens cineastas parisienses
partiam com suas câmeras para as ruas, onde filmavam pessoas comuns em seu
cotidiano banal. Era essa a revolução. Passados 50 anos e depois de a própria
porta- voz do movimento, a revista Cahiers du Cinéma ter sido vendida, o que
resta da nouvelle vague? Resta a chama, sempre renovada. É esse o pensamento do
diretor Walter Salles, autor de "Linha de Passe": "Toda vez que
um jovem realizador empunha uma câmera digital ou de 16 mm e reinventa uma
forma de narrar uma história, ele está continuando a revolução da nouvelle
vague." Segundo Salles, não haveria hoje diretores como o chinês Jia
Zangke e o argentino Pablo Trapero ou a nova geração de artistas romenos sem as
conquistas daquele movimento.
REBELDIA Jean-Pierre Léaud em
"Os Incomprendidos", filme premiado em Cannes
CASAL MODERNO Jean-Paul Belmondo
e Jean Seberg em
"Acossado"
MEMÓRIA Emmanuelle Riva e Eiji Okada
em "Hiroshima, meu
Amor"
E quais foram essas conquistas? A primeira era de ordem
técnica. Foi a partir do final dos anos 50 que inventaram negativos mais
sensíveis, câmeras mais leves e gravadores de som direto. Mas isso não
significaria nada sem uma autêntica vontade criadora. "A nouvelle vague
foi um sopro de ar fresco, a câmera na mão, os filmes Tri-X e o Illford que o
fotógrafo Raul Coutard usou em "Acossado", o corte descontínuo e,
acima de tudo, um desejo de romper com uma temática e uma gramática que não
diziam mais nada a toda uma jovem geração de cinéfilos e cineastas franceses",
diz Salles.
Aparece aqui outra conquista daquele movimento, a chamada
autoria: mesmo sendo fruto de uma atividade coletiva, um filme deveria ser a
expressão de uma mente criativa, ou seja, a do próprio diretor. Expressão essa
flagrante em obras como "Jules e Jim – uma Mulher para Dois", que
narra um triângulo amoroso durante a Primeira Guerra Mundial, ou em
"Hiroshima, meu Amor", de Alain Resnais, sobre uma mulher francesa
que se apaixona por um arquiteto japonês e se vê confrontada com as memórias de
seu amor por um soldado nazista. "Essa ideia de autoria, de um cinema com
personalidade, continua valendo.
Mas não deve ser contraposta ao cinema comercial. A própria
nouvelle vague foi um sucesso de público", diz o cineasta Karim Ainouz, de
"O Céu de Suely".
Talvez por isso, sempre que um grupo de jovens filma com
esse espírito a realidade à sua volta, logo se diz que ele inventou um
"novo cinema", ou seja, uma "nouvelle vague".
Texto e imagens reproduzidos do site: istoe.com.br
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